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Museu. Masp. Imunidade. Requisitos. Isenção

  • 7 de março de 2016
  • Marcello Martins Motta Filho

Fonte: Revista Tributária e de Finanças Públicas Vol. 35, P. 193/209

SUMÁRIO : 1. Surgimento do MASP – 2. Natureza Jurídica – 3. Objetivos Institucionais – 4. Predicados – 5. Conta Corrente no Exterior – 6. Das Formas de Dispensa Legal do Pagamento do Tributo – 7. A Imunidade Tributária e as Instituições de Educação – 8. A Regra Prevista no Art. 150, VI, “c”, da CF/88 – 9. Os Requisitos da Imunidade – 10. Conclusão – 11. Resposta ao Quesito


Consulta

 

O Museu de Arte de São Paulo Assis Chateaubriand – MASP, através de seu diretor, Dr. Luiz de Camargo Aranha Neto, honra-nos com a seguinte consulta :

O Museu de Arte de São Paulo Assis Chateaubriand – MASP, é uma sociedade civil sem fins lucrativos, com sede em São Paulo e tem como finalidade incentivar, divulgar e amparar, por todos os meios as artes de um modo geral, mantendo pinacoteca, biblioteca, fototeca, filmoteca, videoteca, discoteca, organizar cursos de arte, promover exposições de interesse artístico e cultural, etc.

Em 1.996 protocolou pedido administrativo, perante ao Departamento de Rendas Imobiliárias, órgão vinculado à Secretaria das Finanças do Município de São Paulo, requerendo a concessão de isenção no pagamento do imposto predial e territorial urbano, referente aos exercícios de 1.990 a 1.996. O pleito foi fundamentado no modelo de declaração fornecido na repartição pública, onde o representante legal e a contadora do MASP declararam que a entidade cumpre rigorosamente os requisitos do art. 14 do CTN, isto é, não distribui qualquer parcela de seu patrimônio ou de suas rendas a título de lucro ou participação, aplica integralmente seus recursos na manutenção de seus objetivos institucionais no País e mantém escrituradas suas receitas e despesas nos livros adequados estando, portanto, agasalhada pelo preceito desonerativo do tributo municipal. Foi citado como precedente processo administrativo da mesma entidade, relativo aos exercício de 1.981 a 1.989, onde foi deferido o pedido de isenção do IPTU.

Contudo, o pedido foi indeferido, constando da decisão que havia uma declaração do MASP informando a existência de uma conta corrente nos Estados Unidos da América, em Nova Iorque, e que os recursos eram aplicados. Assim, haveria inobservância do inciso II do art. 14 do CTN.

Nos anos de 1.997 e 1.998, novos pedidos de isenção foram formulados pela consulente, sendo indeferido o de 1997, com fundamento na decisão proferida no processo administrativo de 1.996. Para o exercício de 1.998, o consulente teve o pedido deferido.

Assim, formula a seguinte consulta :

Considerando a existência de uma conta corrente bancária no exterior em nome do Museu de Arte de São Paulo Assis Chateaubriand, utilizada para recebimento de doações do exterior, aquisição de livros de arte, catálogos, obras de arte em geral, pagamento de restauros especiais, ou remessas para o Brasil, cujo diminuto saldo é aplicado automaticamente pelo estabelecimento bancário para preservar a perda do valor da moeda, sendo a referida conta utilizada exclusivamente para cumprir os objetivos institucionais do consulente, indaga-se se tal situação afronta o disposto no inciso II do artigo 14 do Código Tributário Nacional ? Em outras palavras, estaria o MASP deixando de aplicar integralmente no país seus recursos na manutenção dos seus objetivos institucionais?


 

Parecer

 

Para bem responder a questão formulada pelo consulente, é imperiosa uma incursão nas origens do Museu de Arte de São Paulo Assis Chateaubriand, sua natureza jurídica, seus objetivos institucionais, seus predicados e a razão da existência de uma conta corrente no exterior.


 

1. Surgimento do MASP

 

O consulente é fruto do idealismo de Assis Chateaubriand, fundador e proprietário dos Diários e Emissoras Associados, naquele período a maior rede de comunicações do país, e do Professor Pietro Maria Bardi, jornalista, marchand e crítico de arte na Itália, à época recém chegado ao Brasil, que possuíam uma visão revolucionária para a época. Criar um museu, com uma coleção de arte européia e brasileira, que não ficasse nada a dever aos maiores museus do mundo, era um grande desafio.

O Museu de Arte de São Paulo Assis Chateaubriand, mais conhecido pelos brasileiros em geral e, em especial, pelos paulistanos como MASP, é uma sociedade sem fins lucrativos, constituída em 10 de março de 1.947, inaugurado em 2 de outubro do mesmo ano, em sua primeira sede, situada na Rua Sete de Abril, nº. 230, onde iniciaram-se as atividades do Instituto de Arte Contemporânea, que ministrava cursos com professores especializados nas diferentes áreas : gravura, desenho, pintura, tecelagem, fotografia, desenho industrial, propaganda, cinema, dança expressiva, balet clássico, rádio, música, teatro, artes gráficas, entre outros. Esses cursos evoluíram para a escola do MASP.

O terreno da Avenida Paulista onde hoje localiza-se a sede do MASP foi doado à Municipalidade de São Paulo por um paulistano, com a condição de que a vista para o centro da cidade nunca fosse escondida. A Prefeitura Municipal cedeu gratuitamente o uso do imóvel ao MASP, pelo prazo de 40 anos, conforme contrato de comodato firmado em 12 de novembro de 1968. Assim, a arquiteta modernista italiana por nascimento e brasileira por opção Lina Bo Bardi, mulher do Professor Bardi, concebeu arquitetonicamente o atual prédio do MASP, preservando a vista e criando um edifício que se tornou único no mundo, composto de dois andares no subsolo e dois andares acima do nível da Avenida Paulista, bem como uma grande praça entre os dois pisos.


 

2. Natureza Jurídica

 

O MASP é uma sociedade civil sem fins lucrativos (cf. art. 1º. de seus estatutos). Na verdade, trata-se de entidade revestida de personalidade jurídica de direito privado, declarado de utilidade pública federal pelo Decreto 50.517 de 02/05/61, utilidade estadual através da Lei nº. 9.727 de 03/09/97 e utilidade municipal por meio do Decreto nº. 36.676 de 20/02/97 e registrada como entidade de fins filantrópicos no Conselho Nacional de Serviço Social do Ministério da Educação (processo 257422/74, de 11/12/75).

As sociedades sem fins econômicos, como decorre de próprio nome, são agremiações que não objetivam lucro, o que significa que reinvestem na própria sociedade. São entidades tipicamente altruísticas, voltadas aos interesses da coletividade.

Já as associações de utilidade pública surgiram em nosso ordenamento jurídico com o Código Civil de 1.916, (art. 16, I). Somente com o advento da Lei nº. 91/35, é que foram legalmente disciplinadas as entidades de utilidade pública. O art. 1º. da referida lei determina que “as sociedades civis, as associações e as fundações constituídas no país com o fim exclusivo de servir desinteressadamente à coletividade podem ser declaradas de utilidade pública, provados os seguintes requisitos : a) que adquiriram personalidade jurídica; b) que estão em efetivo funcionamento e servem desinteressadamente à coletividade; c) que os cargos de sua diretoria não são remunerados”.

O caráter de utilidade pública é concedido pelo Estado, na medida em que certas instituições e sociedades tem como propósito maior servir à coletividade, voltadas ao interesse social, daí resultando seu reconhecimento pelo Poder Público.

Finalizando, além dessas características, é mister destacar que as sociedades sem fins econômicos ou lucrativos, quando de sua dissolução, tem o seu patrimônio transmitido ao Poder Público. Nesse particular, há previsão expressa do art. 49 dos estatutos sociais do consulente, dispondo que na hipótese de extinção, o patrimônio (acervo) passará para o Governo do Estado de São Paulo, que o destinará à Pinacoteca do Estado de São Paulo ou, na sua falta, a instituições congêneres.

Daí o caráter de utilidade pública do MASP, e até hoje mantido, na medida em que possui personalidade jurídica, seus diretores não são remunerados, está em efetivo funcionamento e atende aos requisitos da lei, ou seja, serve desinteressadamente à sociedade.


3. Objetivos Institucionais

 

O art. 2º. dos estatutos do MASP descreve o elenco de seus objetivos : incentivar, divulgar e amparar, por todos os meios, as artes de um modo geral e, em especial, as artes plásticas, visando o desenvolvimento e aprimoramento cultural do povo brasileiro, podendo para esse fim : a) manter pinacoteca, biblioteca, fototeca, videoteca e discoteca; b) organizar e manter cursos de artes; c) instituir bolsas de estudo; d) promover exposições de trabalhos de artistas nacionais e estrangeiros; e) promover conferências, congressos e visitas de personalidades de renome no campo das artes; f) patrocinar trabalhos de pesquisa científica relacionados com o objetivo social; g) promover exibições de filmes e concertos musicais de interesse artístico e cultural; h) manter intercâmbio com organizações congêneres do país e do estrangeiro; i) publicar boletins, revistas, catálogos e livros.

Enfim, a meta é incentivar toda espécie de manifestação cultural que vise à plena realização dos seus objetivos.

O MASP foi criado para ser um museu dinâmico, com um perfil de centro cultural. Por isso, possui nove espaços diferenciados para a realização de exposições temporárias. Em média são realizadas entre 30 a 50 exposições temporárias por ano. As exposições temporárias apresentam os mais variados temas ou suportes. Exposições nacionais e internacionais de arte contemporânea, fotografia, design e arquitetura se revezam durante o ano, trazendo ao público um universo de imagens. Portanto, a comunidade sempre encontra uma novidade em seu retorno ao museu, por mais freqüente que sejam suas visitas.

Cursos, palestras e seminários também estão aliados à programação de exposições temporárias, fornecendo aos visitantes uma possibilidade de se aprofundarem em temas variados, com um contato direto com o curador ou o artista participante de uma exposição e também com o trabalho de monitores formados em História da Arte.

Outros temas culturais, como música, cinema e palestras também fazem parte de suas atividades. Os dois auditórios projetados, são um espaço múltiplo para essas atividades. Grandes ou pequenas mostras de filmes complementam a programação, que podem exibir curtas-metragem no pequeno auditório 80 lugares – ou no grande auditório – 400 lugares.

Há ainda, uma escola especializada em História da Arte, o que é uma retomada da função educadora do museu e visa preparar um público de nível universitário a interagir com o acervo do museu e de outros museus. O curso de Introdução à História Geral da Arte tem a duração de dois anos, com turmas semestrais, e é ministrado por diferentes especialistas da USP E UNICAMP.

Para tantas atividades é imprescindível o apoio da sua biblioteca, verdadeiro centro de documentação e da história do museu, especializada em história da arte e arquitetura. A coleção conta atualmente com cerca de 50.000 volumes incluindo ampla variedade de catálogos e livros de arte, uma coleção de livros raros, cartazes de exposições realizadas pelo museu no Brasil, fotos históricas da instituição, hemeroteca de críticas sobre exposições do museu, o que transformou em um verdadeiro centro de documentação da história não só do MASP como das artes plásticas em geral. A biblioteca atende universitários que preparam teses de mestrado e doutorado no campo da arte.

Mas, para estar sempre na vanguarda, procurando cumprir fielmente seus objetivos institucionais, o consulente se vale do seu fundo social, que é constituído de doações, contribuições, subvenções, por particulares e pelos sócios, bem como das receitas provenientes de cobrança de ingressos, prestação de serviços, vendas de livros, catálogos e aplicações financeiras e auxílios concedidos pelos poderes públicos, inclusive com o recebimento de significativa quantia da Municipalidade de São Paulo.

Assim, verifica-se que não foi por acaso que a instituição foi declarada de utilidade pública, uma vez que é patente tratar-se de uma sociedade civil sem fins lucrativos, onde toda a sua atividade perspícua está voltada ao desenvolvimento da educação e da cultura, como igualmente seu alvo é servir desinteressadamente, toda a coletividade, vale dizer, seu objetivo maior é proporcional o fomento à cultura, as artes, a educação, etc.


4. Predicados

 

Dada a importância das obras de seu acervo e da sua efetiva participação no mundo das artes, inclusive com amplo reconhecimento no exterior, o consulente rotineiramente é convidado para expor sua coleção no exterior. A exposição Masterpieces from Masp foi realizada de março a outubro de 1995 nos seguintes museus japoneses : Tokyo Fuji Art Museum, Tokushima Modern Art Museum, Yokohama Landmark Hall, International Friendship Pavillon (Osaka). O intercâmbio permite que um patrimônio único seja divulgado no exterior, formando uma imagem positiva do Brasil.

Não é demais assinalarmos que, como é do conhecimento público, o consulente abriga em seu acervo a maior coleção de arte ocidental do hemisfério sul, sendo por isso considerado o mais importante museu da América do Sul. Não é menor a sua importância pelas outras atividades culturais, artísticas e educativas que atua. Há pleno reconhecimento internacional, tanto que o consulente é o único museu brasileiro que mantém intercâmbio com museus do exterior, especialmente europeus, americanos e japoneses.


 

5. Conta Corrente no Exterior

 

A questão essencial do parecer, versa sobre a existência de uma conta corrente do consulente no exterior e que, na visão do Departamento de Rendas Imobiliárias da Secretaria das Finanças do Município de São Paulo, não atenderia o disposto no art. 14, II do CTN, que impõe a aplicação integral no país de seus recursos.

No entanto, é mister deixar desde já assinalado que o consulente, em nenhum momento, procurou esconder a existência dessa conta, tanto que em seus balanços fiscais consta explicitamente sua inclusão.

O propósito dessa conta corrente é facilitar o cumprimento dos objetivos institucionais do consulente e, por uma série de razões, auxilia-lo nas relações com seus parceiros estrangeiros.

Melhor explicando.

Antes de esclarecermos os procedimentos que envolvem as transações do MASP no exterior, forçoso admitir que a moeda corrente no mundo das artes é o dólar norte-americano. Não se negocia em reais, liras, libras, marco alemão ou yen. Todos os negócios giram em torno do dólar norte-americano. Além do mais, o centro financeiro do mundo é, sem dúvida, Nova Iorque.

Assim, quando o consulente cede uma obra de seu acervo, por exemplo, um quadro, a um museu estrangeiro para uma exposição temporária, recebe um valor como doação por essa cessão. Essa quantia é sempre estipulada em dólar e, informando o nome do banco, o número da conta corrente, a cidade e o país, o valor da cessão é rapidamente transferido para a conta bancária do consulente em Nova Iorque.

É sabido que os restauros muito especiais de obras de arte, na maioria das vezes, são efetivados no exterior, dando-se um pequeno sinal no início dos serviços, ou com pagamentos mensais até o término do serviço. Assim, possuindo essa conta no exterior, é muito mais prático realizar os pagamentos através de uma transferência bancária, sem os percalços da burocracia que até então tínhamos no país, que exigia a apresentação de uma infinidade de documentos, com parecer desse ou daquele departamento competente.

Catálogos, livros de arte, livros raros que compõem sua biblioteca são, em sua maioria, adquiridos no exterior e o pagamento se perfaz em moeda estrangeira, no caso o dólar, como condição obrigatória do negócio.

Os patrocinadores internacionais, por uma questão de conveniência, consideram mais fácil e prático efetuar um depósito no exterior, em especial em Nova Iorque, do que fazer remessas para o Brasil.

O MASP nunca enviou numerário algum para esta conta no exterior, muito pelo contrário, o que se faz são remessas para o Brasil, para que o consulente possa honrar com suas despesas rotineiras.

Dessa forma, o propósito da conta é tão somente facilitar as transações do MASP com terceiros, cumprindo seus objetivos institucionais. Não há interesse em burlar as leis, o Fisco e, principalmente, desviar de seus objetivos institucionais, uma vez que qualquer movimento da conta seja de entrada ou saída é contabilizado em seus balanços e rigorosamente examinados pelo Conselho Fiscal e pela conceituada empresa de auditoria Price Waterhouse, que assina os balanços ao cabo de cada exercício fiscal.

Nos Estados Unidos da América, todos os recursos de contas correntes são automaticamente aplicados, ficando um pequeno saldo. São as denominadas contas money market. Aqui no Brasil, em época de acelerada inflação, também tínhamos contas desse tipo, denominadas contas remuneradas.

Assim, devidamente elucidados a instituição do consulente, sua natureza jurídica, objetivos institucionais, fundo social, predicados e a razão da conta corrente no exterior, passaremos a analisar o direito positivo frente à consulta formulada.

Não obstante ter o consulente formulado pedido de isenção do imposto predial e territorial urbano perante a Municipalidade de São Paulo, entendemos que o presente caso versa sobre imunidade tributária para as instituições de educação (cf. art. 150, VI, “c”, da CF/88).

Desse modo, devemos analisar o que o direito positivo estabelece sobre o tema, começando pela Constituição Federal e a legislação infraconstitucional, para depois analisarmos dois pontos fundamentais, a saber, o âmbito do conceito da imunidade e seus requisitos, confrontando-os com os objetivos institucionais do consulente e a utilização da conta corrente no exterior.


6. Das Formas de Dispensa Legal do Pagamento do Tributo

 

A doutrina tributária ensina que a isenção é uma não incidência legalmente qualificada. Já a imunidade é uma não incidência constitucionalmente qualificada.

No caso da isenção, o legislador infraconstitucional escolhe fatos econômicos e os coloca como hipótese de incidência na lei. Contudo, num determinado momento, o legislador resolve que certos fatos não devem ser tributados. Nessa hipótese, há dispensa do pagamento do imposto. Então, podemos dizer que na isenção há uma lei que cria o fato gerador e há uma outra lei que dispensa o pagamento. Fica a critério do legislador de qualquer esfera de governo conceder ou não a dispensa do pagamento do gravame.

A imunidade é sempre decorrente da Constituição. São valores escolhidos pela sociedade, inseridos em princípios que o constituinte deixa insculpido na Constituição Federal para dar garantia e resguardo contra o fisco. Por isso, alguns valores, de grande relevância para a sociedade, como a liberdade de expressão, o culto religioso, o pensamento político, social, cultural, a educação, etc., são o suporte das normas imunizantes.

Vale lembrar que, além da guarida daqueles valores, também dá ensejo à imunidade o auxílio que a sociedade presta ao Estado em determinadas tarefas típicas, como, por exemplo, a educação e a assistência social. Pela Carta Magna, coube ao Estado proporcionar a educação e, na impossibilidade de se desimcumbir dessa tarefa, permite que a sociedade o auxilie. É em função desse auxílio que fica garantida a imunidade.

O Professor Edgard Neves da Silva, estudioso das normas imunizantes, ensina que as “imunidades foram criadas estribadas em considerações extrajurídicas atendendo à orientação do Poder Constituinte em função de idéias políticas vigentes, preservando determinados valores políticos, religiosos, educacionais, sociais, culturais e econômicos, todos eles fundamentais à sociedade brasileira. Dessa forma assegura-se, retirando das mãos do legislador infraconstitucional, a possibilidade de, por meio da exação imposta, atingi-los”

O legislador ordinário não tem competência para mudar aquilo que está expressamente previsto na Carta Magna, pois a imunidade tributária é matéria de âmbito constitucional, colocando-se dentro das limitações da competência para tributar. Consequentemente, sua observância se impõe em todas as ordens de governo. Apenas a Constituição Federal pode proibir determinados fatos vinculados a pessoas ou bens, relativamente à hipótese de incidência de tributos, na medida em que, se é a Constituição que tem o poder constitucional para outorgar competência, só ela pode tirar. Aliás, na própria Lei Magna há uma seção dedicada às limitações do poder de tributar.

Finalmente, outro aspecto da imunidade, que deve ser levado em conta, além do caráter teleológico, é a interpretação das normas imunizantes.

Ensina Bernardo Ribeiro de Moraes que “as normas imunitárias devem ser interpretadas através de exegese ampliativa. Não podem ser restritivamente interpretadas, uma vez que o legislador menor ou o intérprete não podem restringir o alcance da Lei Maior.”

Assegura Ives Gandra da Silva Martins que a “adoção de uma interpretação extensiva, que alberga a linha de entendimento atrás exposta, decorre da concepção predominante nos tribunais e na doutrina…”

Essas considerações mostram-se necessárias, uma vez que, tanto no requerimento padrão da Municipalidade, como em muitos momentos do processo administrativo, o consulente e a Prefeitura de São Paulo utilizam a palavra isenção, quando na verdade a figura jurídica aplicável é a imunidade tributária, na medida em que o MASP é tipicamente uma instituição voltada à cultura e à educação, como vastamente demonstrado anteriormente, constituindo, segundo seus estatutos sociais, uma entidade sem fins lucrativos (cf. art. 1º. ).


7. A Imunidade Tributária e as Instituições de Educação

 

Até a Constituição de 37, não se cogitava qualquer resguardo constitucional às sociedades com fins não econômicos ou às instituições de educação ou às entidades assistências ou às associações de utilidade pública. Com o advento da Carta Política de 46 é que houve a introdução da imunidade às instituições de educação ou de assistência social (art. 31, V, alínea b), mantida pela CF/67 e Emenda Constitucional nº. 1 de 1969 (art. 19, III, alínea “c”) e conservada na CF/88 no art. 150, inciso VI, alínea “c”. Contudo, em todos os textos, foram utilizadas as expressões “instituições”.

Desse modo é de indagar se o objetivo do legislador constituinte foi estender a imunidade às sociedades sem fins lucrativos, ou se estas estavam implicitamente albergadas pela norma imunizante.

Ao que tudo indica, o intuito do legislador constituinte foi estender a imunidade às sociedades sem fins lucrativos. Por outro lado, é comezinho, não merecendo maiores considerações, que, quando estivermos diante da interpretação de uma regra imunizante, devemos ter em conta o seu caráter teleológico, isto é, a razão de ser da norma constitucional.

Assim, quer nos parecer que, ao utilizar apenas a expressão instituições, o objetivo do constituinte foi simplesmente identificar uma figura jurídica, mas que tenha como finalidade precípua a coletividade, com o objetivo de difundir a cultura, a educação, a pesquisa, etc., e mais, sem objetivo de lucro. Como o Estado não pode sozinho propiciar à população todas essas atividades, com a outorga da imunidade ele passa a ser auxiliado pelo particular. Daí a concessão do benefício.

Corroboram o que acima dissemos, as preciosas colocações do saudoso Aliomar Baleeiro, inclusive citando como exemplo o museu, entidade da mesma natureza do consulente :

“Instituição de educação não significa apenas a de caráter estritamente didático, mas toda aquela que aproveita à cultura em geral, como o laboratório, centro de pesquisas, o museu, o atelier de pintura ou escultura, o ginásio de desportos, as academias de letras, artes e ciências. O importante é que seja realmente “instituição” acima e fora de espírito de lucro, e não simples “empresa” econômica, sob o rótulo educacional ou de assistência social” (g.n.).
E vai mais além, asseverando sobre a denominação da entidade :

“Importa não a denominação da entidade, que pode ser um disfarce, mas a natureza real de suas atividades e finalidades desinteressadas de lucro ou proveitos para fundadores e administradores. A estrutura jurídica da instituição também não é decisiva porque, sob máscara de associação civil ou mesmo de fundação, pode funcionar uma unidade de interesse exclusivo dum grupo restrito ou duma família”.

O Professor Sacha Calmon Navarro Coelho, a esse propósito, é firme e direto, ao salientar :

“A palavra instituição não tem nada a ver com tipos específicos de entes jurídicos, à luz de considerações estritamente formais. É preciso saber distinguir, quando a distinção é fundamental e não distinguir quando tal se apresente desnecessário. Instituição é palavra desprovida de conceito jurídico-fiscal. Inútil procurá-lo aqui e alhures, no direito de outros povos. É um functor operacional. O que a caracteriza é exatamente a função e os fins que exercem e buscam, secundária a forma jurídica de sua organização, que tanto pode ser fundação, associação, etc. O destaque deve ser para a função e os fins.” (g.n.)

Por essa razão, o Supremo Tribunal Federal afastou o juízo restritivo, ao enunciar : “O conceito de instituição, referido na Constituição Federal, não tem um sentido subjetivo, pois a Carta Magna tratou de evitar as interpretações pessoais, substituindo-as pelo critério do art. 14 e seus incisos da Lei 5.172/66, vale dizer, o CTN” (RTJ 57/277).

Assim, o escopo maior da imunidade, na espécie, foi retirar a tributação de entidades desse naipe, para atender um fim público, de interesse da coletividade, através de uma associação ou instituição ou sociedade sem fins lucrativos que, em seu âmago, almeja servir a todos desinteressadamente e não seus sócios ou associados. Vale dizer, o que o constituinte quis materializar não foi a forma, mas sim a função, o objetivo ou a finalidade.

No caso em tela, não se pode olvidar que o MASP foi declarado de utilidade pública e, portanto, cumpriu os requisitos para a concessão da declaração de utilidade pública, ou seja, não visa lucro e seus objetivos sociais (mencionados no tópico 3) estão voltados única e exclusivamente à sociedade.

Ademais, verifica-se que a subsistência e sobrevivência do consulente advém de um fundo social, que é constituído de doações já efetuadas, das que venham a ser feitas e, ainda, das contribuições, subvenções e auxílios que lhe forem concedidos pelos poderes públicos, pelos particulares, pelos sócios e ainda das receitas provenientes de cobrança de ingressos, de projetos e manifestações artísticas, patrocínio de terceiros, venda de livros, catálogos e publicações em geral, prestação de serviços de restauro e ainda das derivadas de aplicações financeiras ou valores mobiliários. (art. 6º. dos estatutos).

Por essas razões, parece certo que o MASP foi equiparado àquela figura jurídica referida na Constituição Federal (instituições de educação) e, portanto, alcançado pelo preceito constitucional da imunidade.

Por outro lado, deve-se entender o vocábulo “educação” em sentido lato, isto é, tudo aquilo que disser respeito ao processo de desenvolvimento da capacidade física, intelectual e moral do ser humano em geral, visando uma melhor integração individual e social, conhecimentos ou aptidões, o tipo de ensino, aperfeiçoamento integral de todas as faculdades humanas, artes, etc., e não restritivamente as escolas, faculdades, cursos, etc. Aliás, o MASP mantém uma escola de artes.

Em suma, o MASP é uma instituição de educação amparada pelo artigo 150, VI, “c” da Constituição Federal. Entender o contrário é estar em descompasso com as sociedades modernas e com o próprio caráter teleológico da imunidade.


8. A Regra Prevista no Art. 150, VI, “c”, da CF/88

O art. 150, inciso VI, alínea “c” da CF/88, veda a instituição de impostos a certas entidades e sua redação é deveras semelhante com a das Cartas anteriores, verbis :

Art. 150 Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios :

…………………………………………………………………………………………………………………

VI – instituir impostos sobre :

…………………………………………………………………………………………………………………

c) patrimônio, renda ou serviços dos partidos políticos, inclusive suas fundações, das entidades sindicais dos trabalhadores, das instituições de educação e de assistência social, sem fins lucrativos, atendidos os requisitos da lei ;

Não obstante, o citado dispositivo constitucional menciona ao término de sua redação “atendidos os requisitos da lei”. Portanto, para a concessão da imunidade, não basta ser uma instituição de educação, com todas as características anteriormente assinaladas, é necessário o preenchimento de determinadas condições.

Assim, dispensadas outras considerações, levando-se em conta o caráter semântico do sistema constitucional tributário, em sendo a imunidade uma limitação ao poder de tributar, e atentando que as limitações constitucionais são regulamentadas por lei complementar, conforme reza o inciso II, do artigo 146, da CF/88, não resta dúvida que a norma reguladora das limitações constitucionais deve ser complementar. Nenhuma outra legislação que não seja complementar poderá tratar dos requisitos da imunidade, pois haveria submissão ao critério de cada uma das esferas de competência, podendo uma entidade de assistência social ou educação ser imune num município ou num estado e não em outros, em decorrência da adoção de critérios variados pelas diferentes legislações locais. No caso, a lei complementar é o Código Tributário Nacional, em decorrência da recepção.

Desse modo, se a entidade cumprir as exigências legais, gozará da imunidade tributária, vale dizer, haverá uma expressa vedação constitucional da União, dos Estados e dos Municípios de tributar, através de impostos, seu patrimônio, sua renda e seus serviços.


9. Os Requisitos da Imunidade

 

O preceito constitucional da imunidade tributária não é um cheque em branco. A imunidade está condicionada ao preenchimento de certas exigências, para que a Constituição seja fielmente cumprida, abusos, fraudes e excessos, daí o artigo 14 do CTN, verbis:

Art. 14 – O disposto na alínea c do inciso IV do art. 9º é subordinado à observância dos seguintes requisitos pelas entidades nele referidas :

I – não distribuem qualquer parcela de seu patrimônio ou de suas rendas, a título de lucro ou participação no resultado;
II – aplicarem integralmente no País, os seus recursos na manutenção dos seus objetivos institucionais;
III – manterem escrituração de suas receitas e despesas em livros revestidos de formalidades capazes de assegurar sua exatidão.
§ 1º Na falta de cumprimento do disposto neste artigo, ou no § 1º do art. 9º, a autoridade competente pode suspender a aplicação do benefício.
§ 2º Os serviços a que se refere a alínea c do inciso IV do art. 9º são exclusivamente os diretamente relacionados com os objetivos institucionais das entidades de que trata este artigo, previsto nos respectivos estatutos ou atos constitutivos.

Pode-se afirmar, permissa venia, que a aplicação destes requisitos tem a aceitação plena tanto da doutrina como da jurisprudência, diferenciando-se, como não poderia deixar de ser, em função de interpretação juris e facti dos seus conteúdos.

Assim, passaremos a fazer uma análise do mencionado artigo.

O caput faz menção à alínea “c”, do inciso IV, do art. 9º., do próprio CTN. Esse artigo contém praticamente a mesma redação do art. 150, VI, “c”, da CF/88, não merecendo maiores considerações.

O inciso I veda a distribuição de lucros ou de qualquer parcela de seu patrimônio ou de suas rendas, a título de lucro ou até mesmo na participação no resultado. Na verdade, a palavra lucro está relacionada à noção de empresa. Como instituições dessa categoria foram criadas para finalidades altruísticas, não visualizamos qualquer relação com essas entidades. O impedimento legal é distribuir lucro e não ter lucro. Logo, o objetivo dessa restrição é instigar que todo acréscimo patrimonial seja revertido em prol da sociedade. Desse modo, a instituição pode e deve lucrar. Lucrar, com o escopo de ampliar seu patrimônio e, consequentemente, prestar melhores serviços a um número maior de pessoas.

Quanto ao patrimônio, diga-se que todo o patrimônio do consulente, isto é, seu cabedal de quadros, esculturas, livros, etc., a pedido do MASP, foi tombado junto IPHAN, o que significa que em nenhuma hipótese poderia haver distribuição e, mesmo que não estivesse tombado, de forma alguma haveria a dilapidação de seu patrimônio. No tocante às rendas, aos lucros ou participação dos resultados, é sabido que o MASP não goza de excelentes condições financeiras, pois sua fonte de subsistência depende exclusivamente do resultado dos eventos que patrocina. Sem contar as doações e os recursos que recebe, até da própria Municipalidade de São Paulo, que cobre parcialmente seu orçamento.

Com efeito, sua contabilidade é estritamente correta e rigorosa, conforme se infere dos documentos acostados ao processo administrativo, elaborada no estrito rigor da legislação vigente, isto é, em livros revestidos de formalidades capazes de assegurar sua exatidão. Essa conduta atende a exigência prevista no inciso III do referido artigo e vem sendo cumprida severamente, até porque é através dessa escrituração que os entes públicos podem fiscalizar adequadamente as operações realizadas pelas entidades imunes, quais sejam, não distribuição de lucros e aplicação integral de seus recursos no país. Ademais, seus balanços anuais ainda são auditados pela Price Waterhouse. E, os valores recebidos da Prefeitura do Município de São Paulo a título de subvenção de auxílio são rigorosamente auditados pela Secretaria de Finanças e pelo Tribunal de Contas do Município.

Por sua vez, o inciso II, apontado como não atendido pelo consulente, demonstra que o legislador objetivou impedir a remessa de recursos ao exterior para manutenção de outra entidade, isto é, a uma entidade filial ou vinculada a ela, ou seja, vedou que a aplicação dos recursos no exterior fosse utilizada para o desenvolvimento social e educacional de instituições estrangeiras, em prejuízo das atividades institucionais das alcançadas com a imunidade no país.

O simples fato de haver uma conta corrente no exterior, não quer dizer que o consulente não aplique seus recursos integralmente no Brasil.

A uma, porque a existência dessa conta corrente em nenhum momento foi escondida, tanto que sempre constou em seus balanços. Assim, possuir uma simples conta bancária no exterior não implica em afirmar que os recursos não estejam sendo aplicados no país para concretização de seus objetivos institucionais.

A duas, a conta tem como principal propósito receber doações do exterior, isto é, de empresas, bancos, de pessoas físicas domiciliadas no estrangeiro que gostam de auxiliar e colaborar com museus, receber numerário pelo empréstimo de obras de seu acervo, etc.

A três, com os valores lá existentes e disponíveis, pode-se adquirir novos catálogos, livros de artes, livros raros, participar de leilões internacionais, etc. Da mesma forma, pode-se pagar restauros das obras de seu acervo, o frete de obras de arte que vem de outros países para suas constantes exposições, seguro do transporte, empréstimo de obras de outros museus ou entidades afins, etc.

O MASP nunca patrocinou exposição no exterior ou algum artista estrangeiro. Jamais os recursos dessa conta bancária foram utilizados em desacordo com suas finalidades sociais. Todas as suas atividades são voltadas para a cultura do povo brasileiro.

Em hipótese alguma houve desvio de finalidade, com remessa de numerário para o exterior para atender objetivos que não sejam os institucionais, muito pelo contrário, constantemente aporta valores em sua conta corrente no Brasil, para atender seus objetivos institucionais. A declaração do Conselho Fiscal é firme nesse sentido.

Além disso, se, por hipótese, remessas fossem feitas para o exterior, para aquisição de bens materiais necessários à instituição, isso não significa remessa de lucro ou parte de seu capital para o exterior, ofensiva ao art. 14 do CTN, mas atendimento de suas finalidades institucionais.

A propósito das finalidades essenciais, já tivemos oportunidade de asseverar :

“A expressão finalidades essenciais, no nosso sentir, deve ser entendida como fins estabelecidos nos estatutos ou nos atos constitutivos das entidades imunes, pois são nos estatutos que estão hospedados todos os seus objetivos. A doutrina é uníssona no sentido de que as atividades devem estar diretamente relacionadas com os objetivos institucionais das entidades, pois, do contrário não haveria sentido para a norma imunizante. O § 2º, do art. 14, do CTN reforça nossas colocações quando diz “… relacionados com os objetivos institucionais das entidades de que trata este artigo, previstos nos respectivos estatutos ou atos constitutivos”.

Por outro lado, observa-se da parte final do lacônico despacho de fls. 248 do processo administrativo nº. 37-001.916-96/70 que, muito embora o MASP não faça remessas de valores para o exterior, “… permanece o fato de que recursos do Museu (patrocínios e doações) são aplicados no exterior.” E, mais adiante, observa : “O MASP aplica recursos no exterior contrariando a exigência do art. 14, inciso II, do CTN.”

Qual o sentido que o funcionário ofereceu à expressão “aplica” ?

– Seria o sentido contido no CTN, isto é, de aportar capital nos objetivos institucionais ou de aplicação financeira ?

Na hipótese de se entender que o intuito foi referir-se ao Código Tributário Nacional, não resta a menor dúvida, como acima constou, que os recursos do consulente são integralmente aplicados em seus objetivos institucionais. Mas, se tiver a conotação de aplicações financeiras, da mesma forma não houve afronta aos requisitos do indigitado art. 14 do CTN.

Ora, é de capital importância assinalar que os recursos depositados nessa conta quando aplicados tem como único propósito evitar a perda do valor real da moeda, mesmo sendo dólar norte-americano. Aliás, essa atuação deve nortear todo administrador prudente. E, como dissemos anteriormente essa espécie de aplicação (money market) é muito comum naquele país. Outrora, já houve no Brasil aplicação semelhante, com a denominação de conta remunerada.

Mas, independentemente do nome da aplicação financeira, não parece razoável que uma instituição perca a imunidade em virtude de aplicação no mercado financeiro, cujo resultado é revertido para seus objetivos sociais.

Assim indaga-se :

– O que deveriam fazer as instituições :
– Deixar esvanecer seus recursos, pela corrosão da moeda, ou socorrer-se das aplicações financeiras ?
– É justo punir fiscalmente aquela instituição que objetiva proteger seu patrimônio ?

A resposta é intuitiva, pois é dever do bom administrador zelar as finanças das instituições, com o propósito de incrementar os recursos disponíveis para que a sociedade possa efetivamente cumprir seus objetivos institucionais, ou seja, aumentando, incrementando a instituição com o resultados das aplicações.

A doutrina tributária é uníssona no sentido que as instituições devem preservar seu patrimônio com as aplicações financeiras :

“Realmente, por vezes, é conveniente utilizar os valores financeiros de forma imediata, momentaneamente mais interessante para a própria preservação de seu patrimônio, como é o caso de aplicação no sistema financeiro, protegendo-se da desvalorização da moeda, de forma a permitir o futuro atendimento às finalidades estatutárias”
“Também os lucros e ganhos de capital, desde que destinados às finalidades essenciais da instituição imune, estão fora da incidência dos impostos.
O imposto de renda, como fartas vezes já disse o Supremo Tribunal Federal, não incide sobre os ganhos de capital das pessoas imunes.
Muito menos o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF), que não raro repercute sobre os rendimentos e o patrimônio.
O Imposto sobre Movimentação Financeira (IPMF), hoje travestido de contribuição (CPMF), também não incidia sobre a renda das entidades constitucionalmente protegidas, como declarou o STF.”
A esse respeito, a jurisprudência pretoriana tem entendido que as limitações constitucionais alcançam os ganhos de capital que estão fora do campo de incidência:
“TRIBUTÁRIO. IMPOSTO DE RENDA. ENTIDADES PRIVADAS DE PREVIDÊNCIA SOCIAL FECHADA. APLICAÇÕES NO MERCADO FINANCEIRO. DEC-LEI 2.065, DE 1983.
1 “A renda, de qualquer natureza, inclusive a obtida em over-night, open, bolsa de valores e quejandos, das entidades fechadas de previdência social são imunes a incidência de imposto de renda.
2 O parágrafo 1º., do art. 19, da CF/69, refere-se expressamente a alínea a, do inc. III, do art. 19, para limitar a imunidade tributária estendida as autarquias, ao patrimônio, renda e serviços vinculados as suas finalidades essenciais ou dela decorrentes. Essa limitação não alcança as entidades de previdência social.
3 Embargos providos.” (Proc. nº. 90.01.13487-4/DF, rel. Juiz Nelson Gomes da Silva).
4 Remessa improvida. (Relator Juiz Tourinho Neto , TRF 1ª. Região, 3ª. Turma, Proc. nº. 0117881, ano:92, DF, DJ de 10-05-93, p. 16943).”

Diversos outros julgados também se alinham nesse sentido.

Portanto, com relação a ganhos de capital, não parece razoável que esse resultado, que é revertido em prol do consulente, configure causa impeditiva do reconhecimento da imunidade. É imperioso preservar a perda do valor da moeda, até mesmo para acréscimo de seus frutos, objetivando ampliar suas encomiásticas atividades. A exigência de aplicação dos recursos no Brasil, segundo o indigitado art. 14 do CTN, almeja impedir a remessa de lucros ao exterior, ou a prestação de auxílio financeiro a sua similar no exterior.

Ademais, não se vislumbra na legislação infraconstitucional oposição a qualquer forma de investimento, seja em aplicações financeiras, seja em ativos imobilizados, que são revertidos em seus objetivos institucionais, mediante o prudente arbítrio de seus componentes.

Finalizando, concluí-se pelo entendimento doutrinário e jurisprudencial que a receita extraordinária, no caso financeira, quando conexa com os fins estatutários, deve ser alcançada pela imunidade. E mais : como ficou evidenciado, as receitas financeiras advindas das aplicações praticadas pelo consulente são ocasionais e esporádicas. Trata-se, portanto, de receitas acessórias.

Por derradeiro, cumpre transcrever o art. 5º. dos estatutos sociais do consulente que, praticamente, reproduz a norma do art. 14 do CTN :

“Art. 5º. – A sociedade não remunera quaisquer sócios ou membros de seus órgãos de direção nem distribui qualquer parcela de seu patrimônio ou de suas rendas a título de lucro, participação ou vantagens de qualquer natureza no seu resultado, e aplica integralmente no país os recursos na manutenção de seus objetivos institucionais.” (g.n.).

Por todos esses motivos, não incide na espécie o § 1º., do art. 14 do CTN, sendo inadmissível o indeferimento do período de aplicação da norma desonerativa, seja a título de isenção ou de imunidade, pois, como acima constou, o MASP vem cumprindo rigorosamente os requisitos condicionantes do favor fiscal.

Assim, resulta evidente que o MASP constitui uma entidade nacional que fomenta o desenvolvimento e estimula o aparecimento de novos artistas. Por conseguinte, sendo intento do legislador impulsionar atividades culturais voltadas à coletividade, sem fins econômicos, parece certo que o consulente atende a exigência legal, procurando politizar a sociedade brasileira no âmbito das artes e da cultura, em estrita consonância com a sua carta institucional.

Sob esse prisma, entendemos que o consulente é uma entidade que cumpre os requisitos legalmente estabelecidos para o reconhecimento da imunidade tributária.


 

10. Conclusão

 

Face ao exposto, pode-se concluir :

a) sendo o consulente uma sociedade civil sem fins lucrativos, com a natureza de instituição de educação em sentido lato, cujo objetivo é fomentar a cultura, bem como levando-se em conta a teleologia da própria imunidade e a interpretação extensiva que deve ser conferida às normas imunizantes, deve ser equiparado a uma instituição de educação, encontrando-se ao abrigo do art. 150, VI, “c”, da CF/88, uma vez que o constituinte não se preocupou com a forma, mas sim prestigiou a finalidade e a função da pessoa jurídica. Assim, não há como negar ao MASP a qualidade de entidade imune ;

b) a existência da conta corrente no exterior e a aplicação financeira de eventuais recursos dela decorrentes não tem finalidade financeira empresarial que possa desnaturar a exigência do CTN, até porque esse mecanismo é realizado na defesa do patrimônio da empresa e converge para a observância das finalidades essenciais do consulente, tendo como propósito preservar o valor da moeda, para que seus objetivos possam ser satisfeitos ;

c) sendo o consulente uma entidade imune, conforme regras constitucionais atinentes as instituições dessa natureza, e uma vez atendidos os requisitos do art. 14 do CTN, não há como negar o pedido de reconhecimento da imunidade.

d) na hipótese improvável de não ser o consulente equiparado a uma entidade imune, é forçoso admitir que acham-se atendidos os requisitos estabelecidos no CTN, para o reconhecimento da isenção prevista no art. 18, II, “b”, da Lei Municipal nº. 6.989/66, com a redação dada pela Lei nº. 10.211/86.


 

11. Resposta ao Quesito

 

Pelo exposto, considerando as conclusões acima enunciadas, podemos responder a consulta formulada da seguinte forma :

A existência de uma conta corrente no exterior e os recursos aplicados, em nome do Museu de Arte de São Paulo Assis Chateaubriand, utilizados exclusivamente para satisfazer as finalidades institucionais do consulente, não afronta o art. 14 do Código Tributário Nacional .

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