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Tribunais Reconhecem a Imunidade Tributária ao Livro Eletrônico

  • 7 de março de 2016
  • Marcello Martins Motta Filho

Fonte: Associação Brasileira de Direito Tributário – ABDT, Editora Del Rey, Belo Horizonte, set./dez., 2000, vol. 07, p. 383 a 387


 

É sabido e plenamente constatável que a evolução tecnológica vem trazendo grandes avanços para a sociedade em geral e, em especial, para a economia. Já para o Direito, o progresso tecnológico vem acarretando debates jurídicos sublimes, pois muitas situações atualmente não estão previstas expressamente em lei.

Aliás, para os estudiosos no Direito, controvérsias em torno de novos fatos jurídicos não são novidades e não poderia ser de outra forma, uma vez que o surgimento da norma sempre ocorreu da constatação das alterações sociais, do comportamento da sociedade, isto é, dos novos hábitos, costumes, valores, etc., procurando adequa-la ou inová-la dependendo do caso concreto.

No que tange à tributação, tendo em vista a rigidez própria do sistema tributário, as mutações que o avanço tecnológico vem propiciando estão deixando alguns conceitos atualmente conhecidos no Direito Tributário totalmente desatualizados. Como exemplo, podemos citar os conceitos de territorialidade, competência, mercadoria, serviços, sujeição ativa e passiva, estabelecimento comercial, local da prestação, etc., que adquirem contornos e particularidades muito diferentes dos conceitos até então existentes quando vistos sob a ótica do progresso tecnológico. Tome-se como exemplo os negócios celebrados pela Internet, onde não existem fronteiras físicas ou jurídicas, dificultando a instituição de tipos tributários e, consequentemente, a determinação de quem é competente para exigi-los, ou de quem é a obrigação de pagar o gravame.

Entrementes, outra discussão que está sendo alvo de intensa celeuma, e agora sob o manto do Poder Judiciário, refere-se à tributação do livro eletrônico.

A questão que se coloca é a seguinte :

– Estaria o livro eletrônico, que via de regra vem inserido num suporte físico – CD-ROM ou num disquete – amparado pela imunidade tributária prevista no art. 150, “d” da Constituição Federal?

Essa controvérsia é justificável, pois o constituinte de 1988 ao tratar das limitações do poder de tributar, no caso, aos livros, aos jornais, aos periódicos e o papel destinado à sua impressão, não explicitou sobre a publicação eletrônica.
Não obstante, a doutrina, em quase sua unanimidade, sustenta que o livro eletrônico deve merecer o mesmo tratamento tributário concedido ao livro confeccionado em papel.

Por outro lado, a jurisprudência, acompanhando a maioria das posições doutrinárias, vem, pouco a pouco, decidindo que a imunidade tributária deve ser estendida às obras eletrônicas.

Um dos primeiros casos examinados foi o do Dicionário Aurélio Eletrônico editado pela editora Nova Fronteira, quando a 4ª. Câmara Civil do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro confirmou sentença de primeira instância que reconheceu a incidência da imunidade tributária.

Destacam-se do voto vencedor do Des. Wilson Marques os ensinamentos do festejado e saudoso Aliomar Baleeiro, no sentido de que ” livros, jornais e periódicos são todos os impressos ou gravados, por quaisquer processos tecnológicos, que transmitam idéias, informações comentários, narração reais ou fictícias sobre todos os interesses humanos, por meio de caracteres alfabéticas ou por imagens e, ainda, por signos Braïlle destinados a cegos”. E, em outro trecho, enuncia : “Dentro do conceito do notável tributarista baiano, o Dicionário Aurélio Eletrônico é um livro, porque é um veículo de transmissão de idéias, informações e comentários gravados por processo tecnológico.”

Desta forma, sendo o Dicionário Aurélio Eletrônico equivalente ao Dicionário Aurélio em papel, deve receber o mesmo tratamento tributário.

Ainda no Estado do Rio de Janeiro, o Tribunal Regional Federal da 2ª Região, igualmente entendeu que nenhum imposto deve incidir sobre o livro eletrônico. E o relator, Des. Vieira de Carvalho, foi mais além, ao dizer que “o jornal que leio, via Internet, jornal é” , ou seja, até mesmo as publicações veiculadas pela Internet também devem ser agasalhadas pela imunidade tributária.

O Tribunal de Justiça de São Paulo, por sua vez, também já apreciou três casos versando sobre o livro eletrônico.

O primeiro julgamento, escorando-se nas palavras do tributarista Hugo de Brito Machado, conclui no sentido que “a Constituição Federal assegura a veiculação de cultura e informações; portanto, livros editados em papel ou em compact disc têm o mesmo objetivo, conteúdo e finalidade, ou seja, levar a informação e conhecimento ao seu usuário”

Ainda dentro do Tribunal paulista, tivemos o julgamento do caso envolvendo a publicação eletrônica LIS – Legislação Informatizada Saraiva, da editora Saraiva, externado num CD-ROM.

Com efeito, antes de examinarmos o acórdão proferido, merece destaque a r. decisão monocrática, que fez brilhante comparativo do livro em papel e do livro eletrônico, verbis :

Assim, o LIS – Legislação Informatizada Saraiva é um periódico, atualizado bimestralmente, contendo textos legais, isto é, como as revistas editadas em papel que contêm as mesmas informações. Consequentemente, não deve estar sujeito a incidência de impostos como é assegurado as referidas revistas, na forma do mencionado artigo 150, VI, “d” da Constituição Federal. “ (g.n.).

Já o acórdão proferido pela 8ª Câmara de Direito Público, estribando-se no caráter teleológico da imunidade que “não é outra senão a de facilitar a divulgação de idéias, de pensamentos, de mensagens, enfim, tudo o que aproveita ao cidadão”, confirmou integralmente a r. sentença recorrida.

E o brilhante voto vencedor do Des. Toledo Silva, após tecer várias considerações sobre a imunidade tributária, das novas espécies de publicação e dos valores que devem ser preservados na imunidade tributária, conclui seu voto advertindo :

“A prevalecer o entendimento arcaico das agravadas (no caso, Fazendo do Estado e do Município de São Paulo), a manifestação do pensamento, através dos meios eletrônicos, sofrerão profunda restrição, o que não é admissível.” (g.n.).

Finalmente, o último julgado, bem analisou o caráter teleológico da imunidade tributária, averbando que tanto as obras em papel como aquelas externadas em CD-ROM tem a mesma finalidade e que a Constituição Federal jamais quis proteger o papel, mas sim o conteúdo, ou seja, a divulgação dos textos, verbis :

Em face das explanações acima, conclui-se que a Constituição Federal assegura a veiculação de cultura e informações; portanto, livros editados em papel ou em compact disc têm o mesmo objetivo, conteúdo e finalidade, ou seja, levar a informação e conhecimento ao seu usuário.

Ressalte-se, ainda, que a norma inserta no Texto Maior não tem o condão de proteger o papel, instrumento de materialização e meio de veiculação; seu objetivo maior é o conteúdo, visando proporcionar a divulgação dos textos.

Destarte, irrelevante a forma de edição da obra, pois qualquer livro, jornal ou periódico impresso em papel, não perderá sua característica principal se for editado em CD-Rom ou mesmo disquetes para computadores.

Essas decisões não poderiam concluir de outra forma. Até pouco tempo atrás, as publicações conhecidas eram confeccionadas em papel. De alguns anos para cá, tais publicações passaram a ser substituídas pelas publicações eletrônicas, que compreendem tudo aquilo que não é publicado em papel. Ou, em outras palavras, o livro eletrônico é uma das espécies do gênero livro. Da mesma forma, teremos o jornal eletrônico e o periódico eletrônico, que serão gênero do jornal e do periódico, contudo externados numa mídia.

Na verdade, o livro, o jornal e o periódico não precisam necessariamente ser confeccionados em papel. Podem ser elaborados tanto em papel, como em plástico ou outro meio – em forma eletrônica (CD-ROM ou disquete). Poder-se-ia, afirmar, mutatis mutandis, que não há diferença na essência entre a obra externada numa mídia eletrônica e em papel, pois ambas decorrem de uma criação intelectual e possibilitam a manifestação do pensamento.

Por outro lado, não podemos deslembrar que a imunidade tributária prevista no art. 150, “d”, da CF/88 visa proteger valores e princípios da sociedade, tais como, cultura, idéias, ensino, informação e os princípios da liberdade de pensamento, de expressão (art. 5º, IV, da CF/88) e de imprensa (art. 220 da CF/88) e uma das formas desses valores serem externados é através do livro, do jornal e dos periódicos.

Assim, o intuito do constituinte não foi imunizar o livro, o jornal, o periódico, mas sim, uma gama de valores que a sociedade brasileira quis que fossem resguardados e que necessitam ser veiculados através dos três instrumentos acima citados. Essa a tônica maior a ser preservada. A teleologia da imunidade é resguardar os princípios esculpidos na Constituição Federal.

Finalmente, partindo-se da interpretação extensiva que deve ser conferida às normas imunizantes, parece certo que o tratamento tributário dado pelos Tribunais era de se esperar, na medida em que pouco importa o instrumento que divulga as informações – em papel ou em meio eletrônico.

É possível que as decisões judiciais acima citadas sejam apreciadas em grau de recurso extraordinário pelo Supremo Tribunal Federal; contudo, considerando que o Excelso Pretório reconheceu imunidade às listas telefônicas, que não constam expressamente do texto constitucional, é de se prever que igual tratamento seja conferido ao livro eletrônico.

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